☕ Café com Satoshi #2: "survival mode" na cripto-lândia
Dezembro viu o bitcoin renovar a mínima do ano. A 17 meses do próximo halving (redução programada na inflação), a moeda se aproximou dos 3 mil dólares, e ensaiou uma recuperação tímida em seguida.
Boa parte dos indicadores on-chain que acompanhamos já mostra níveis equiparáveis aos dos fundos dos últimos ciclos de baixa (à exceção do NVT - Network Value to Transaction).
📐 Mercado de mineração se ajusta
A hashrate na rede do BTC caiu 31% desde o início de novembro, o equivalente a 1.3 milhões de máquinas S9 da Bitmain sendo desligadas. O bitcoin é uma commodity de oferta inelástica. Por mais que flutue o investimento em mineração, não varia a quantidade de moedas “produzidas” por unidade de tempo. A indústria depende de uma dinâmica elegante que ajusta a dificuldade de se minerar na rede a cada cerca de duas semanas. Quando variações de preço abruptas ocorrem entre um ajuste e outro, a rentabilidade de quem minera pode ficar comprometida. É o que vem acontecendo, com ajustes bruscos como não se via desde 2013. A receita coletiva da indústria caiu de U$ 13 milhões em BTC/dia emitidos no início de Novembro para cerca de U$ 6 milhões em BTC/dia. Mineradores com margens menores, sob pressão financeira, ou desprovidos de energia barata estão desligando ou se desfazendo de máquinas em massa.
Fluxos de bitcoin comandados por mineradores são indicativo da confiança destes no potencial de apreciação em curto prazo. Muitos mineraram “no prejuízo” ao longo de 2017, por exemplo, na expectativa de vender BTC a preços mais altos, adiante. Outros liquidam suas recompensas em intervalos regulares para cobrir custos operacionais. Dados oriundos do monitoramento de carteiras das maiores pools de mineração do mundo denotam vendas em volumes acima da média, semanas antes de os preços despencarem no meio de Novembro. É delicado apontar a anomalia como causa do movimento, dadas ocorrências similares em Setembro que não impactaram preços severamente. Mas dá pra dizer que o fluxo negativo puxado por f2pool e slushpool teve influência não-trivial no sell-off recente.
Na última newsletter, comentamos sobre a cisão entre dois forks do Bitcoin: BCH e SV. Os dois grupos opositores passaram semanas competindo por apoio, e, a julgar pela atitude de bolsas importantes no ecossistema, a facção do BCH “venceu”. As aspas se devem ao fato de que ambos os lados saem do embate no prejuízo, além de, provavelmente, terem contribuído para o despejo massivo de bitcoin no mercado, em Novembro.
🌊 Moedas antigas se movimentam
A transparência da blockchain nos permite determinar a “idade” de cada bitcoin (quando foi minerado ou movido pela última vez). A derrocada da moeda em 2018 pode ser associada a movimentações em “co-horts” específicos (grupos de moedas com a mesa idade). A ilustração abaixo agrupa aquelas movidas pela última vez em [<1ano]; [1-2 anos]; [2-3 anos]; [3-5 anos] e [>5 anos]. As linhas coloridas representam a porcentagem de moedas em circulação que se encaixam em cada “co-hort”, ao longo do tempo, enquanto a linha preta denota o preço do bitcoin. Vê-se que, além da linha verde (moedas com menos de 1 ano desde a última movimentação), a roxa (3 a 5 anos) é a que teve queda mais significativa desde 2017 - ou seja, parte dos donos de moedas nessas características as passaram adiante. Vale notar que a linha azul clara (moedas com mais de 5 anos) cresce sustentavelmente desde sempre.
👋 Onda de demissões
Uma matéria da Forbes escancarou a crise financeira que assombra boa parte das empresas capitalizadas primariamente em cripto-ativos. A Consensys, incubadora de projetos na Ethereum e bastião do ecossistema, demitiu 13% da sua equipe. Funcionários que estavam na LaBitConf, no Chile, receberam a notícia por telefone e foram dispensados ainda durante o evento. A SpankChain, plataforma de micro-pagamentos para entretenimento adulto, enxugou seu staff em 66%. A Steemit, uma das redes sociais tokenizadas mais antigas em existência, cortou 70% da folha de pagamento. A ETCDev, grupo de desenvolvedores proeminente no universo da Ethereum Classic, fechou as portas por falta de caixa. Até a BitMain, gigante chinesa da mineração, foi levada a desativar plantas em Israel e anunciar medidas de austeridade.
O ano passado propeliu uma febre que levou empresas de todas as indústrias a se debruçarem sobre blockchains, cripto-ativos e o bitcoin. Em Outubro de 2017, menções a esses termos em reuniões de board e calls entre analistas de Wall St. disparavam junto com os preços. Em matéria recente, a Axios refaz o estudo e mostra que o entusiasmo se esvaiu com a mesma velocidade com que cresceu (vide gráfico abaixo).
🔍 Novos ângulos
Hasu, um de nossos autores favoritos, publicou artigo em Dezembro que vale a leitura. “Unpacking Bitcoin’s Social Contract” explica como agora se reconfigura o contrato social que rege o dinheiro (e a propriedade privada, em última instância) há milênios. Outro texto recente interessante é “Understanding the Ethics of Bitcoin Through the Ideas of 19th-Century Thinker Georg Simmel”, da revista Tablet. Reserve algumas horinhas para repensar preconceitos político-econômicos, e se divirta.
No Brasil, a última semana trouxe cripto-ativos de volta à pauta. A Kria, start-up de crowd-equity, capta investimentos nesta semana através da primeira oferta de um security token brasileiro autorizado pela CVM. Não relacionado: dias atrás, o Superior Tribunal de Justiça publicou acordão de processo em que declarou o bitcoin fora da competência do BACEN e da CVM - devendo procedimentos inquisitivos prosseguirem nas respectivas justiças estaduais, e não na instância federal.
🔭 Dando um zoom-out
A história não se repete, mas rima. Fechamos a newsletter anterior com um gráfico de preço do BTC em escala logarítmica, que atualizamos agora (cortesia de Awe & Wonder). A lógica proposta pela representação é a de que o ativo oscila (regride) entre a faixa inferior e superior (progride) de uma curva de longo-prazo. O patamar de regressão atual (o gráfico amarelo, abaixo do principal) se aproxima daqueles que indicaram fundos nos ciclos de baixa de 2011/12 e 2015/16.
🔢 Números & datas
+U$ 120.000.000: Valor somado dos $ETH colateralizados no sistema de débito da moeda estável MakerDAO.
U$ 54,00-64,00: Faixa de preço do $ETH, em dólares, na qual estão programados para serem liquidados os colaterais de mais da metade das posições de débito aberta no sistema.
+U$ 1.600.000: Capacidade transacional da rede de segunda camada Lightning Network, no Bitcoin.
14 de janeiro: Data acordada para o hard-fork “Constantinopla” na Ethereum. Os cronogramas originais previam o upgrade anos atrás.