☕ Café com Satoshi #3: re-Capitulando o ano das cripto em 10 histórias
2018 não vai deixar boas lembranças para quem esperava ver o mercado tocando de novo as máximas do ano passado. Foi um período de esfriamento de ânimos, de adeus a novos entrantes desiludidos; de seguir construindo, gerir risco e se preparar para um novo ciclo que deve começar em antecipação ao halving de 2020.
🕙 O ano das criptomoedas em 10 tópicos
1. 2018 começou com o BTC valendo U$ 13-14 mil. O “piso” dos U$ 10 mil dólares foi perdido ainda em janeiro, e, em fevereiro, a moeda já chegou perto de U$ 7 mil. Depois de um semestre de volatilidade decrescente, na faixa dos U$ 6-7 mil, mais uma queda brusca levou o ativo para perto dos U$ 3 mil, naquele que foi o “fundo” de 2018.
2. A tão aguardada Lightning Network foi lançada em fevereiro. Trata-se de uma rede suplementar à do Bitcoin, para a realização de pagamentos rápidos e baratos, que vinha sendo desenvolvida há anos como resposta a impasses de escalabilidade. Ainda em beta, acumula mais de 2 mil nós participantes e ~U$ 2 milhões de capacidade transacional. Viável somente após a implementação do SegWit, no ano passado (em meio à embate que culminou com uma cisão entre o BTC e o BCH), também acumula críticas pela usabilidade complicada e arquitetura questionável.
3. Após um 2017 desenfreado, ICOs perderam fôlego como modelo de financiamento. U$ 1.5 bilhões foram arrecadados em janeiro por ofertas do tipo - valor que caiu a cerca de U$ 150 milhões em dezembro. ICOs estrelados, como o da Kodak ou do Telegram, saíram dos holofotes, sob cerco crescente de autoridades norte-americanas. Investimento de VC segue em alta na indústria.
4. É comum que mercados de alta levem investidores a diversificar para ativos alternativos (com mais risco, atrás de maiores retornos). Os cripto-ativos “subprime” (numa comparação com a última crise financeira) de 2017 foram os tokens ERC20. Puxaram um movimento de desalavancagem que dizimou ganhos ao longo de 2018 - sem fluxo de caixa ou valor intrínseco associado, muitos viraram pó. A convexidade destes ficou evidente, uma vez que boa parte dos times na indústria se acostumou a armazenar seus tesouros… em uma combinação de $ETH/$BTC + tokens alheios.
5. Como era de se esperar, a SEC desceu o martelo. Depois de acordo (com multa) com fundador da exchange EtherDelta, ordenou a Paragon e AirFox (dois projetos de token na Ethereum) que se registrassem junto ao órgão e oferecessem devolução dos fundos a investidores de seus respectivos ICOs. A Pantera Capital anunciou que até 25% de seus investimentos (em fundo de ICOs) podem estar sob a mira da SEC.
6. Não foram só Telegram e Kodak que “entraram na moita” depois de terem feito alarde exacerbado. Incontáveis projetos atrasaram lançamentos em meio ao mau humor do mercado (não se tem ouvido mais falar em DFINITY ou Filecoin, por exemplo). Muitos outros enxugaram operações, em dificuldades financeiras (Steemit, ETCDEV, Spankchain e a própria Consensys, como reportamos na newsletter passada), ou fecharam as portas por questões regulatórias (como a Basis, que tinha levantado mais de 100 milhões de dólares e se comprometeu a devolver tudo).
7. Depois da CBOE lançando futuros de Bitcoin em dezembro passado, este ano viu investimento pesado em soluções de custódia e compliance voltadas para grandes investidores. Fundos de endowment vanguardistas começaram a se posicionar na classe de ativo (como Yale, com alocação de U$400 milhões em um fundo de cripto). Houve abertura de veículo similar a um ETF, na Suíça; e o anúncio da Bakkt, projeto de peso liderado pelos donos da bolsa de Nova Iorque (NYSE). Mas ainda não foi desta vez que a SEC aprovou o lendário ETF de bitcoin - a essa altura, um bom punhado de pedidos já descansa em paz na gaveta.
8. Ataques de 51% migraram da especulação à realidade. Vertcoin, Bitcoin Gold, ZenCash e Verge foram alvo de empreitadas do gênero nesse ano, revelando a fragilidade latente de muitas moedas no mercado. Mais notável ainda foi o fork do BCH em duas moedas (BAB e BSV), e a “guerra de hashpower” que se seguiu para que cada lado do embate se protegesse de ataques do outro. A realocação massiva de energia de alguns dos maiores mineiros do mundo surtiu efeito até na rede do Bitcoin.
9. “De-platforming” voltou a ser assunto ao redor do mundo. Após testemunhos de CEOs do Facebook e Google frente ao Senado americano, as “big tech” se moveram para “banir discursos de ódio” em suas plataformas. O resultado foi uma onda de expulsões e revolta de criadores de conteúdo em inúmeras categorias. O Patreon também se viu forçado a orfanar alguns de seus usuários mais populares, cortando acesso a meios de pagamento. Vale lembrar que foi o bloqueio das doações ao WikiLeaks, em 2011, que trouxe a primeira grande onda de atenção pública ao Bitcoin.
10. O mercado de ações norte-americano sofreu retração considerável no último trimestre. Os sinais de aproximação de uma nova recessão fizeram emergir a questão: como cripto-ativos (e o Bitcoin, em especial) se comportarão durante um eventual crash no mercado financeiro?
📍 10 artigos que nos ensinaram algo novo
Bitcoin Data Science (pt. 1): HOLDwaves: decifrando os ciclos do bitcoin do ponto de vista de quem segura (ou não) suas moedas.
On the immaturity of tokenized value capture mechanisms: analisando modelos de tokens para entender quais (se) capturam algum valor.
Cryptocurrencies are money, not equity: uma lição óbvia que passou despercebida durante a febre dos ICOs.
Unpacking Bitcoin’s Social Contract: “nós não mudamos o bitcoin - é ele que muda a gente”.
The Resolution of the Big Block Experiment: uma retomada histórica do conflito filosófico e embate técnico que marcou os últimos anos no bitcoin e cindiu a comunidade.
Who controls Bitcoin core?: um olhar objetivo sobre a manutenção do código do Bitcoin e os processos de implementação de melhorias.
Visions of Bitcoin: destilando 7 narrativas que conduziram o desenvolvimento do Bitcoin ao longo de sua primeira década de vida.
Visions of Ether: exercício similar ao anterior, aplicado à segunda maior moeda em capitalização - o Ether -, cuja história é mais curta, mas não menos recheada.
The Bitcoin Mining Network - Trends, Marginal Creation Cost, Electricity Consumption & Sources: estudo detalhado que desmistifica muitas lendas em torno da indústria da mineração de cripto-ativos.
The Dark Underbelly of Cryptocurrency Markets: entendendo os incentivos perversos que conectam emissores de novas moedas, donos de bolsas/corretoras e sites de mídia importantes na indústria.
🚪 Entrando em 2019
O crypto-Twitter anda abundante em previsões sobre como o Bitcoin deve se comportar nos próximos meses. Há os que acreditam que um fundo já foi encontrado perto dos U$ 3 mil, e os que juram que ainda chegaremos à faixa entre U$ 1.5 e U$ 2.5 mil. A verdade é óbvia: ninguém tem certeza de nada.
Jogos de Minoria: eis aqui uma leitura curta e fascinante para adentrar o ano. Resumo: α=P/N, onde N é o número de agentes no jogo, e P é o número de “histórias observáveis”. Se N é pequeno, há muitos jogadores em relação às diferentes “histórias de mercado que podem ser percebidas”. Se N é grande, há muitas “histórias perceptíveis” para poucas pessoas. Os dois extremos levam a comportamentos coletivos bem diferentes. Vale a reflexão, no contexto dos ciclos do Bitcoin, que dão falsa sensação de segurança ao mesmo tempo em que, de fato, demonstram anti-fragilidade.
🔢 Números & datas
+1000: Estimativa de demissões a serem confirmadas pela Bitmain, maior mineradora do mundo, na virada do ano (de um total de ~3100 funcionários).
~10%: Arrecadação projetada de ICOs realizados neste dezembro, em relação ao montante levantado em janeiro (mês de pico).
3: Número de cripto-ativos que estava no top 10 (em “market cap”) há 5 anos atrás e que termina 2018 ainda dentro do grupo.