☕ Café com Satoshi #55: O Velho Que Me Raptou Pra Contar Quem É Satoshi 🕰️
Uma coisa BIZARRA aconteceu comigo. Preciso lhes contar.
Estava saindo de um painel, numa conferência, quando me agarraram pelo braço. O recado foi atípico. Tinha um homem me esperando numa sala privada. Era urgente.
Usei como desculpa pra desviar da multidão. Me levaram até a sala, fechei a porta, e o tal homem me encarou de frente. O rosto dele era familiar. Foi direto ao ponto:
- Você vai ser Satoshi Nakamoto.
🕰️ Um Viajante no Tempo
- Quê?! - eu reagi confuso.
Tenho uma lista própria de candidatos a Satoshi, e nunca tive sequer um dos requisitos para participar dela. Mas o homem não me deixou raciocinar:
- No dia 7 de agosto de 2008, você vai chegar do futuro com a missão de criar o Bitcoin.
Enquanto falava, ele tirou algo do bolso, e mostrou na palma da mão: uma caixinha metálica toda ornada, com um brilho latente, parecendo estar quente.
Eu já assisti muito filme de ficção científica. Aquele troço certamente se passaria por uma máquina do tempo, numa produção de segunda linha.
📅 Por Que Aqui, e Agora?
A tarefa de se "criar o Bitcoin” não me soava tão impossível quanto um dia parecera - depois de revisar muitas vezes suas circunstâncias e linha do tempo. É claro que eu jamais teria inventado o negócio “sozinho”. Mas, com os recursos e o conhecimento de antemão… provavelmente toparia o desafio. Tanto eu quanto aquele homem sabíamos disso.
Por isso, não perguntei “Por que eu?!”. Preferi indagar:
- Por que aqui, e agora?
Os olhos do homem brilharam. Ele devolveu de bate-pronto:
- Não é sobre criar o Bitcoin nesse universo. Mas em todos os universos.
- Como assim?! - eu já estava ficando atordoado - Não basta criar o Bitcoin no meu passado, pra que ele exista no meu futuro?
O homem respirou fundo e se sentou numa cadeira da produção do evento. Ele era velho, percebi pela primeira vez. Devia ter 80 ou 90 anos. Preservava a coluna ereta e os ombros largos. Carregava uma ironia implacável na voz. Ele questionou:
- Você sabe o que acontece num universo em que o Bitcoin acaba não existindo?
🌌 Um Universo Sem Bitcoin?
- Quantos universos existem? - perguntei.
- São infinitos. - ele respondeu.
- Contáveis, ao menos?
- Sim. - o velho endireitou os óculos no nariz com a ponta do dedo - Mas em todo universo onde o Bitcoin não existe, o sofrimento é eterno.
- Duvido. - eu queria testar a seriedade daquele senhor - Certamente alguma iteração nova acaba sendo inventada no lugar. Provas de espaço-tempo, um milagre criptográfico… a ciência não tem limite.
O homem me lançou uma rajada de fúria com os olhos. Rebateu:
- Isso não acontece. O Bitcoin foi uma anomalia. Não precisava ter acontecido. Mas, agora que existe, deve ser defendido. Eu acompanho o número de universos em que já plantei o Bitcoin: é astronômico. Chega a ser um pouco deprimente. Mas me conforta o fato de que, em alguns universos, o Bitcoin acaba de fato se tornando um dinheiro universal… e, aí, a vida é ilimitadamente próspera.
🌱 Plantando Satoshis
Então era verdade o que diziam os cypherpunks. Tínhamos todas as probabilidades contra nós.
Fica difícil escolher entre comemorar a conquista, ou lamentar pelos outros universos que não tiveram o mesmo privilégio.
Eu voltei a mim, e desafiei o homem:
- Por que você não vai direto pra 2008, me busca lá, e evita de fazer saltos temporais desnecessários? Não faz mais sentido? Podia economizar energia e até transformar ela em bitcoin…
- Ha! Boa piada. Em 2008 você ainda era um energúmeno! Não teria acreditado em mim. Quantos anos levou pra enxergar o potencial do Bitcoin?
O homem estava certo. Eu tinha perdido várias oportunidades de comprar moedinhas baratas quando era mais jovem. Ele emendou:
- Você está pronto, aqui e agora. Nosso tempo é finito. Preciso fazer esse encontro valer. Sua missão não é inventar o Bitcoin em 2008 nesse universo, mas noutro.
Aí eu me arrepiei. A história começava a fazer sentido.
Aquele homem levaria uma vida qualquer nessa dimensão, enquanto eu me apropriaria da caixinha preta e faria o próximo salto. Iria até agosto de 2008, em outro universo. Lá, eu criaria o Bitcoin e zarparia para um terceiro universo, sem deixar rastro.
Neste terceiro universo, eu encontraria alguém para passar a missão adiante. Faria o mesmo que aquele homem recém fizera comigo.
⛓️ Uma Corrente de Blocos
- Pelo menos eu vou ter as moedas do Satoshi… - murmurei, esperançoso.
O homem negou com a cabeça. Já tinha ouvido aquilo milhões de vezes.
- Estas são mineradas pela cápsula do tempo. Ela nunca vai te dar as chaves privadas.
Ele me explicou que, quando a rede que eu inventasse chegasse ao bloco #100.000, a cápsula seria ativada de novo, me levando pro meu destino final. Eu teria cem mil blocos - de agosto de 2008 a dezembro de 2010 - pra fazer o que tinha que ser feito. O senhor jurou que tudo isso era pra minha proteção.
Então, ele abaixou a cabeça em direção à caixinha, e sorriu. O sorriso dele era meu, e nos unimos num laço de resignação e orgulho.
Peguei a caixinha da mão dele e me fixei nela. Quando levantei a vista, o homem não estava mais lá.
Queria ter perguntado “quem inventou o Bitcoin no primeiro universo?", mas era tarde demais. Queria ter me despedido, mas isso aparentemente não estava no script.
A caixinha preta tinha um visor com três informações. O número gigante de saltos temporais já registrados. A hash do bloco gênese, esperando pelo momento de começar a ser minerado. E a data e universo de destino.
O projeto daquele homem era faraônico. Eu tinha um papel pequeno. Um ponto numa linha. Inventaria o Bitcoin noutro universo, e desapareceria que nem Satoshi.
Aquele velho era a personalidade que eu assumiria depois de zarpar. Quando virasse ele, eu buscaria por uma nova versão de mim, num outro, terceiro universo…
… e seguiria espalhando o Bitcoin, entre todas as dimensões possíveis, uma por uma, num loop perpétuo, formando uma corrente, pela eternidade.
Este texto é uma tradução livre de “An Overwhelming Task", de Sergio Lerner. Sergio é o cara que descobriu e investigou as 1 milhão de moedas mineradas por Satoshi. Vale a pena ler tudo que tem no blog dele. As fontes originais das imagens você encontra clicando nelas.
📚 Dicas de Leitura
🐒 A Narrativa Por Trás de Otherside (atareh.eth)
Uma thread explicando a história complexa sendo construída em torno do game que a Yuga Labs vem desenvolvendo para os Bored Apes. Uma masterclass de como tratar NFTs como um meio narrativo com vida própria.
📐 O Trilema da Escalabilidade em DAOs (Kevin Owocki)
Um tweet e um gráfico pra entender o trade-off que acomete toda organização descentralizada na hora de escalar.
🗺️ The Audacity of The Network State (Brian Doran)
Uma crítica ao livro novo do Balaji Srinivasan, com essa ilustração legal sobre o “novo eixo de polarização” proposto pelo ex-CTO da Coinbase.
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