☕ Café Com Satoshi #58: Como a Ethereum foi 54% Capturada por Robôs 🤖
As cabeças mais brilhantes da Ethereum só falam nisso: MEV.
Um fenômeno obscuro, que também vai afetar o Bitcoin lá na frente.
Nessa newsletter você vai entender o que é MEV. Por que coloca a neutralidade da blockchain em risco. Quem são os moleques lucrando bilhões com isso. E como até você vem dando dinheiro pra eles.
A leitura vai custar 5 minutos.
👷 A Crise do MEV
MEV (Maximal Extractable Value) é o lucro que se pode ter reordenando ou excluindo transações dentro de um bloco.
Se você vai comprar um token na Uniswap, eu vejo esta transação sendo enviada, compro o token antes, pra subir o preço dele, e vendo pra você mais caro… eu capturei MEV.
Ataques de “front running”, como este, simplificado acima, são uma dentre várias formas de MEV. Outros exemplos são arbitragens e liquidações de dívida em protocolos de crédito (quando você toma uma chamada de margem em DeFi, não é uma empresa, mas sim um destes robôs, que te liquida).
Hoje, metade do volume na Uniswap (maior exchange descentralizada) deriva da extração de MEV. Robôs competindo entre si para sugar o máximo de lucratividade da atividade on-chain.
MEV existe também no Bitcoin (um exemplo notável foi a chance que a Binance teve de fazer uma re-org há 2 anos atrás). Mas é mais vibrante conforme maior for a complexidade da atividade econômica de uma dada rede. A Ethereum, hoje, é o paraíso do MEV 🏝️
Muitos pensam que essa “festa dos robôs” é prejudicial aos usuários humanos da blockchain. Pois gera externalidades negativas, como preços piores para o varejo.
Tarun Chitra, da Gauntlet, explica o outro lado da moeda. MEV também traz externalidades positivas. Uma delas é o potencial de aumentar o faturamento dos produtores de blocos de uma blockchain, e permitir uma emissão monetária mais baixa (menos inflação).
Originalmente, os produtores de blocos mais antenados desenvolviam seus próprios sistemas para capturar MEV.
Na Ethereum, um grupo de hackers anteviu que isso geraria problemas. Se o produtor de blocos é quem ordena as transações ali dentro, e há lucro pra ser extraído dessa reordenação, a neutralidade da rede entra em risco - ele pode excluir ou atrasar operações para maximizar seu lucro.
Esse grupo de hackers se chamava Flashbots.
🤖 Quem São of FlashBots?
Em 2019, Phil Daian publicou um paper chamado “Flash Boys 2.0”. Nele, mostrou como essa “forma de explorar ineficiências” estava prestes a virar um modelo de negócio. E vislumbrou que “mercados privados de order flow” se tornariam um diferencial competitivo entre mineradores/validadores.
Esse “order flow privado” faria validadores monopolizarem o MEV. O mercado de espaço em blocos seria explorado em detrimento de pequenos usuários. Se validadores podem conquistar uma margem maior reordenando transações, eles o farão, mesmo que isso desestabilize o consenso.
Phil Daian propôs uma maneira de prevenir o desastre: separar as funções do “montador” (builder) e do “validador” (proposer) de cada bloco.
No cenário ideal de Phil, os produtores de bloco nem precisariam ver as transações que estão registrando na blockchain, para que não tenham chance de “bagunçar” elas.
Se houvesse um mercado livre para o MEV, em vez de um monopólio dos validadores, a neutralidade da rede seria preservada no longo prazo.
Nos últimos 2 anos, a Flashbots desenvolveu uma série de produtos pra materializar essa visão.
🏗️ Proposer-Builder-Separation (PBS)
A essa altura do campeonato, uma separação formal entre “proposer” e “builder” está prevista pra ser implementada a nível de protocolo, na Ethereum. Ela deve incorporar técnicas criptográficas que “escondem” transações de validadores até que inclusas num bloco. Antes de isso acontecer, a Ethereum “está na mão” da Flashbots.
Seu produto mais recente é um patch para validadores, chamado MEV-boost. Os validadores que o instalam têm faturado em média 3-4% a mais por bloco. Isto porque, além do subsídio inflacionário e das taxas transacionais normais, o MEV-boost recolhe propinas, a cada bloco, para o validador.
Essas propinas são pagas por aqueles que “montam” cada pacote de transações enviado pelo software da Flashbots. Os robôs enxergam oportunidades de MEV, montam um pacote de transações para explorá-la, e enviam pela Flashbots, com a garantia de que um validador vai executar aquela sequência inteira, na ordem… ou não vai nem ver as transações do pacote.
A propina é uma forma de o “montador” dividir o MEV que extrai com o validador que lhe coloca dentro dum bloco.
~54% dos produtores de blocos na Ethereum usam esse patch. E, por ser uma entidade americana, a Flashbots adere à lista de sanções de OFAC - excluindo transações “ilícitas” de todos estes blocos.
Isto não significa que 54%+ dos validadores estão ativamente censurando transações. Eles podem estar conectados à Flashbots mas também outras fontes, que, por sua vez, manipulam e enviam transações sancionadas.
O risco é o de que a Flashbots dê um passo adiante. Se escolher não construir mais blocos em cima de blocos que contenham transações sancionadas (além de meramente ignorar essas transações em seus próprios blocos)… aí essa penetração entre validadores coloca a Ethereum sob risco sério de um fork.
E, nesse fork, é possível que transações sancionadas fiquem à deriva, restritas à sua própria cadeia minoritária.
⚔️ A Última Defesa: Social Slashing
O que aconteceria se uma maioria dos produtores de bloco decidissem não construir mais sobre blocos que contém “transações sancionadas”?
A Ethereum viraria submissa a uma “blacklist” do governo. Perderia a neutralidade.
Eric Wall argumenta que a linha de defesa final, nesse caso, é social. Cabe aos operadores de “nós completos” (full nodes) da Ethereum contra-atacarem, e "queimarem” (slash) os saldos em stake dos censores que derem esse passo.
Essa previsão está inscrita no protocolo. Este é o risco que se corre ao produzir blocos no proof-of-stake: perder as moedas que ficam travadas (no jargão técnico, “slashing”).
Mas não existe jeito seguro de provar a censura de um validador automaticamente. O critério, em última instância, deve ser social. Os etherinos literalmente precisam declarar um oponente e queimar-lhe as moedas em stake, com uma atualização manual no software.
A ameaça pode ser suficiente para deter os aspirantes a censores. Os maiores grupos de validadores - Lido, Coinbase, Kraken - guardam bilhões de dólares em ETH travados, sendo muitos destes de clientes. Arriscá-los é mais que uma decisão de compliance; é uma decisão de negócio.
Se algumas dessas der um passo à frente, aí sim, podemos ter uma guerra civil na Ethereum… parecida com a que houve no Bitcoin em 2017.
E restará a pergunta: será que a comunidade valoriza mais a resistência à censura… ou a legitimidade que todas essas empresas conferem ao ecossistema?
👨🏫 4 Palestras Recomendadas
Ao longo dessa newsletter, linkei três palestras da DevCon (evento anual da Ethereum) que ilustram a urgência do problema do MEV. Abaixo, seguem mais 4 dicas. Estas têm entre 10 e 20 minutos cada 👇
🦇 Ultra Sound Money (Justin Drake)
O pesquisador diferencia os casos "quentes” e “frios” do dinheiro, traçando um caminho pra que o ETH valha mais de U$100K.
🌌 Debloqueando Hipercomplexidade Civilizacional (Venkatesh Rao)
O autor compara a cultura etherina a outras ideias históricas que aumentaram a quantidade de futuros possíveis: como o perdão, no Cristianismo; a separação da Igreja e do Estado; etc.
🗿 “Let's Start a RAI-ot!” (Fabio Hildebrand)
RAI é a stablecoin mais descentralizada do mercado. Mas sua resiliência vem a custo de escala: é bem menor que as concorrentes. Entenda nessa palestra a visão dos “Bancos Centrais 100% automatizados”.
🌶️ Como Falar Com Garotas Usuários Em Festas Nos Seu App (Alex Van De Sande)
Lições de anos de design na Ethereum, num formato fácil de digerir. Vai usar um gráfico de pizza pra representar um conjunto de tokens? Pode diminuir ele além do que imagina. Mas use as mesmas cores das moedas originais.
Paradigma Education
🐦 Twitter: @ParadigmaEdu
📸 Instagram: @paradigma.education
🏠 Nossa plataforma: Paradigma.education
🎓 Curso grátis de Bitcoin: www.7DiasDeBitcoin.com.br